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[Crônicas de Sofia] - Atrasada


Crônicas de Sofia - Biblioteca de Sofia

Crônicas de Sofia - Atrasada

Segunda-feira - 10:45 da manhã

Estava em um sono incrivelmente bom quando meu celular toca, acordo, tateando sobre a cômoda ainda de olhos fechados, apanho o telefone preguiçosamente e atendo.

- Alô… - digo com voz de sono.

- Carolina cadê você?

- Quem tá falando? - Meu raciocínio ainda estava lerdo.

- Sua chefe! - Ela fala brava do outro lado. Enquanto eu saltava da cama olhando a hora no visor do celular.

- Eu estou… no médico! - Disse inventando na hora - Passei mal antes de sair de casa, mas acredito que em 30 minutos chego aí!

- Ah, ok. Traga-me o atestado então.

- … - Eu parava do outro lado da linha - Tudo bem… até daqui a pouco…

- Até. - Ela desligava enquanto eu mexia no guarda roupas a procura de qualquer coisa de vestir.

- Ai, meu Deus, estou tão ferrada… por que que eu fui sair para a balada ontem...

Vestia-me às pressas, puxava a gaveta para pegar minha meia-calça, porém algo sai em minha mão, olho e o puxador tinha saído inteiramente da gaveta, com parafusos e tudo mais. Respiro fundo.

- Ok, este não é meu dia… - Atiro o puxador do outro lado do quarto, que por sinal estava totalmente desorganizado e puxo pelas laterais, abrindo a gaveta, visto minha meia-calça, ponho a sapatilha e corro até o banheiro para lavar o rosto.

Por azar havia apenas um na casa, meus pais estavam viajando e minha única companhia era meu irmão mais novo, sim, eu teria que fazer o papel de babá. Puxo a maçaneta, trancada.

- Ei, estou atrasada João, saí logo por favor!

- Estou fazendo a barba, espera, já acabarei. - Ele fala tranquilo.

- João, é sério cara, saí daí! - Eu esmurrava a porta.

- Na próxima venha antes, acho que ainda vou tomar banho.

- Você está ferrado, quando se atrasar eu vou trancar a porta do banheiro e sair pela janela! - Bradava, andando rápido, pegava um pão, colocava na boca, abria a porta e saía pelas escadarias do prédio.

Chegando na garagem, eu vasculhava meus bolsos à procura da chave do carro, por sorte, havia a esquecido em minha jaqueta amarela, desativo o alarme, ligo o carro e piso fundo até o serviço.

Já na clínica, onde era recepcionista, Amanda encarava-me desafiadoramente atrás do balcão, onde era o meu lugar.

- Desculpe, eu passei mal vindo pro trabalho, mas como não era algo tão grave acabei nem pedindo um atestado… - ela impedia-me.

- Não precisa mentir, olhe para você, os cabelos emaranhados, a voz sonolenta no telefone, olheiras, maquiagem borrada, e sua camiseta virada do lado avesso, eu sei que não estava no médico. - Virava-me para o espelho às minhas costas. Ela tinha razão, estava tão ruim quanto, mas não podia perder este emprego.

- Amanda eu… - interrompia-me outra vez.

- Chega. Em duas semanas três faltas, cinco atrasos, e quando vem, ainda não realiza seu trabalho com eficiência, passe no RH. - As últimas palavras atingiram-me como pedras.

- Mas… - ela olhava-me com cara de poucos amigos. - vou indo...

Virava-me indo até lá, estava na rua.

Pego meu carro e vou até a biblioteca, aproveitaria o meio dia para usar o espelho de um dos banheiros, daria uma “ajeitada” em minha situação estética.

Caminhei até recepção, onde uma garota de cabelos azuis e batom preto, entretinha-se tanto lendo um livro que nem percebeu a minha chegada.

- Oi. - Ela assusta-se ajeitando os óculos - Gostaria de usar o banheiro.

- Ah sim, deixe seus pertences como celulares e bolsas, naqueles armários e eu te darei a chave.

- Ok - eu colocava minha bolsa ali, trancando o enrolando o cordão em minha mão.

- Aqui está, é no final do corredor a esquerda. - Ela sorria e eu a olhava com desdém, segurava as chaves em minha mão e marchava até lá, mas foi ajeitando-me diante ao reflexo do meu ser que as lágrimas começaram a escorrer por meus olhos.

A porta se abriu e por ela entrou a senhorita recepcionista esquisita, ela parecia não ter notado nada, porém pegou um pedaço de papel e entregou em minhas mãos.

- Eu não sei o que houve, moça mas espero ajudar.

- Obrigada… - enxugava minhas lágrimas.

- Teve um dia ruim? - Ela pergunta.

- Acabei de ser demitida…

- Lamento… - ela franzia os lábios - talvez precise de uma distração.

- Como assim? - Pergunto confusa arrumando meus cabelos.

- Um livro, algo que irá fazer-lhe desligar-se dos problemas pelo menos um pouco.

- Pode ser…

- Venha comigo tenho um ideal para ti. - Saímos do banheiro trancando a porta, ela caminha entre os corredores de uma das salas de literatura brasileira, enquanto eu perdia-me no cheiro de velharias. - Tome! - Sorria entregando-me uma obra de capa amarela com a figura de Dom Pedro.

- 1808? - Lia o título.

- Sim, acredite, esse livro vai ser capaz de mudar o que está sentindo, tem humor nestas páginas garota.

- Mas, é história do Brasil…

- Sim, sim, mas nada impede de ser bom, confie no que digo.

- Ok… então vou levar esse…

- Venha comigo, farei sua carteirinha e já poderá ir.

Enquanto ela digitava e passava meu livro em um leitor de códigos de barras eu olhava para a enorme placa dourada sobre a mesa.

- Matilde? - Ela observava-me confusa.

- Ah, isso? - A garota virava a placa para si - Não, está com o nome da garota que está em férias, eu sou Sofia e aquele, - apontava para um rapaz - é o Diego, estamos substituindo os “muitos” funcionários deste lugar. - Eu ria.

- Então, Caroline, seu livro está registrado, terá que devolvê-lo daqui a sete dias e pode renovar mais três vezes, aqui estão os seus documentos, sua carteirinha, espero que aprecie a leitura e boa sorte.

- Obrigada, Sofia. - Despedi-me da garota simpática saindo enquanto guardava minhas coisas e acabei esbarrando em alguém. - Perdão.

- Perdão digo eu… - Dizia um rapaz de aparência interessante, notando a água que tinha derramado em minha jaqueta.

- Não foi nada, mas, sou Carolina. - Sorri.

- André. - Ele retribuiu.

E assim iniciava-se uma longa história.

 
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